Estou num café de bairro, daqueles simples, onde a verdade das coisas se vive e não vai além daquilo que o ego acaba por tomar. A verdade está nas pessoas e não naquilo em que acreditam, ainda que as convicções possam determinar qualquer coisa nas suas vidas.
Por aqui, as conversas que não vão para lá do banal, denunciam o que de mais banal e estúpido tem a nossa vida. De uma maneira ou de outra, a banalidade em cada um de nós, costuma revelar-se no grau de estupidez que temos de deixar sair, soltar, libertar do corpo, como que a expurgar o que de menos interessante encontramos no espelho. Porque a vida é difícil e na verdade, não há nada como um aditivo para a tornar mais interessante. O aditivo é indefinido como tudo o que a vida nos proporciona. Eu escolhi a arte...
Ao ouvir estes homens, porque as suas mulheres têm mais que fazer, penso na monotonia das suas vidas e remeto isso à minha. Como algo que não consigo evitar mas que está presente. Sempre presente. Indissociável ao corpo que me ofereceram, reflexo do local onde vivo e penso as coisas do dia-a-dia.O meio é pobre e assumo que só aqui estou por estar a escrever sobre isso. Vou bebendo a minha bebida. Vou vendo as bebidas dos outros surgir em catadupa. Vou bocejando a minha apatia e ouvindo o que as mulheres dos outros já não têm paciência para ouvir, provavelmente por acreditarem numa coisa maior que um dia os uniu e lhes ofereceu o fruto que um dia a vida há-de colher.
O som das máquinas, do vidro das garrafas no vidro do balcão, têm um ritmo indefinido como tudo o que nos espera. As conversas atropelam-se no ar, as páginas de um jornal fácil vão-se passando sem que os olhos as decifrem ao som de uma conversa ainda menos interessante. Volto a bocejar a apatia da vida. Penso que podia estar a fazer por mim noutro sítio qualquer, noutro sítio qualquer da Europa, onde a densidade populacional é maior, onde a probabilidade de encontrar gente motivada e com menos necessidade de expurgar a estupidez se torna igualmente maior.
Hoje penso nisto, mas não faço nada do que devia estar a fazer. Rigorosamente nada. Porque a palavra que tenho não chega para desembrulhar esta prenda de fim-de-semana. Que ao menos podia estar escrita com mais argúcia que um bocejo a lamentar o facto de aqui estar, num simples café de bairro onde nada mudou. Confirmo, nada mudou, porque hoje não estou para mudar coisa nenhuma. Vou continuar a bocejar e a ver o entusiasmo daquilo que a vida não é, mas que denuncia ser.