quinta-feira, outubro 19, 2006

Passo por aqui muitas vezes. Estaciono o carro e fico a ver uma árvore, obcecado pela forma, pelo recorte, pela textura. A luz vai mudando com o passar do tempo, e esta pequena árvore, vai tomando o espaço com o seu candeeiro de rua, que a ilumina de a alto a baixo, mostrando que o vento está presente nas pequenas luminescências que ondulam como o brilho da água do mar.
A chuva chegou e vai-lhe devolvendo o verde e a jovialidade que ainda tem. Com a mesma naturalidade com que mudamos de pele. Está assente em frente a uma biblioteca de construção contemporânea, onde os livros, mesmo os mais antigos, são devolvidos ao público com uma cara nova, depois que a arrumação por área de interesse, por cronologia, por tema, por autor, foi disposta numa estante com "ar" a condizer, e assim, esperam eles, que a leitura se torne um pouco mais apelativa.
Os mais novos vão brincando do lado de fora, indiferentes ao estado do tempo, com aquela inocência que oculta o risco de uma virose que outrora já matou. E quem não fez isso em criança? Ou não quis fazer? Belos tempos, esses em que a saúde transbordava e nos dávamos ao luxo de poder apanhar uma valente molha, enquanto corríamos desmedidamente.
A luz ía-se fazendo passar para onde faz falta, e a noite ía chegando devagarinho, sem impedir que a genica de um corpo a esticar, terminasse antes do reconfortante chá quente com torradas a acompanhar depois do banho tomado.
Imóvel mas sem constrangimento, continua esta singularidade da natureza, que afinal se agita com o passar do vento, e que duvido que queira saber das alegrias ou das tristezas das pessoas que são verdadeiramente alheias ao seu grau de sublime.
É reconfortante vir olhá-la para aqui. É reconfortante saber que não lhe devo nada nem ela a mim. Sabemos que sem mim continuará aqui, a ondular com o vento. Eu que sem ela terei de ir buscar reconforto a outro lado, quem sabe, dentro da biblioteca a procurar livros dentro de uma estante bonita e a condizer, sabendo que dos dois alguém vai ter de avançar um gesto, e o mais provável é ser eu, pelo simples facto de gostar de olhar para ti, no silêncio do que rodeia, ao som do que nos liga.
Amanhã, com aprovação ou não, vou voltar aqui.

3 Comments:

Blogger Noa said...

Engraçado com senti este texto. Mais do que os outros.
Senti-o de uma forma diferente, especial.
E aproveito para dizer que também passo por aqui muitas vezes ultimamente. E voltarei, com aprovação ou não. Voltarei.
:o)
Um beijo.

21 outubro, 2006  
Anonymous Anónimo said...

A Noa anda assídua aqui do espaço. Ainda bem! És de bom gosto e é sempre bom reencontrar-te!
Também senti este texto de forma diferente mas palpita-me que isto ainda é só o princípio...ainda vais fazer-nos sentir mais e melhor, cada vez melhor!!Deixa ser o blogue a decidir que tipo de blogue ele quer que saia dos teus dedos.
Continua que eu gosto e volto sempre em busca de mais!
Se quiseres passa no meu blogue e procura no arquivo de junho ( dia6) um texto que fiz sobre uma árvore que (infelizmente) foi a minha confidente e amiga e que agora é uma vivenda!!!! O que é pena.
Beijoca e fica muito bem.

21 outubro, 2006  
Blogger Ricardo Frutuoso said...

A Noa, como todos os que quiserem, até agora vocês as duas, podem ser presas voluntárias deste pequeno espaço. É com agrado que vos recebo, e nunca pensei exclusões. Obrigado por dedicarem tempo, o vosso tempo, à leitura dos textos, até já,
Ricardo Frutuoso.

21 outubro, 2006  

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