segunda-feira, janeiro 22, 2007

De tarde, ao lado de um gradeamento verde que deixa transparecer o interior, a luz amena sobre a frescura da relva que se estende a recortar campos de ténis, e um edifício polidesportivo, desses iguais aos que há por todo o lado, a fazer lembrar a farda de um estudante num colégio estrangeiro, onde a igualdade do traje pretende dissimular hierarquias que acabam por não se desvanecer assim tão facilmente, ainda que o princípio seja de bom tom.
Passou ao lado deste gradeamento verde, do lado de lá da estrada, ladeada por um passeio em calçada prestes a saltar com a chuva do Inverno, de fato cinzento a cambalear a dança de um desvio de sentido, um homem a quem a natureza reservou com certeza um quarto de delírio por perna, em cada passo que dava, em cada metro que se arrastava, num trajecto coerente mas a abanar o tronco como uma palmeira ao vento.
É uma imagem constrangedora quando um fato se passeia nestas condições.
Não fosse o fato e talvez nem tivesse reparado na forma cambaleante do andar.
O fato como algo que pretende dar evidência a uma imagem de estabilidade em sentido lato, começa realmente a entrar em desuso, mas verdade seja dita, há fatos e fatos…
Mas a estranheza de tal figura inquietou-me, talvez pelo enquadramento desportivo, ou talvez pelo cão que se afastou receoso de quem não chegou a frequentar tais aulas de dança. Tudo se afigurou de modo estranho. O sujeito a cambalear com um ritmo apressado, o cão a desviar-se num quase ganir e eu dentro do carro, a pensar na vida e a escrever este texto, que parece esgotar-se com a qualidade de uma peça de roupa que não tenho por hábito usar.
O cão continua perdido, ás voltas, o homem já nem o vejo, o carro já trabalha e o dia está prestes a anoitecer.

sábado, janeiro 20, 2007

Os pedaços reconstroem-se surgidos do chão, a levitar no ar, em pequenas reflexos brancos que moldam o que de mais há a contornar os corpos e as coisas. Vamos dançando a forma do nome e dando nos formas a estas pequenas partículas etéreas.
Aguardamos respostas no tecto do mundo com o espelhar atento que nos banha os olhos. Agitamos o ar que por sua vez nos agita a nós e nos define o espaço. Este espaço vazio de tudo o que não é história e a origem do solo. Do subsolo. Por onde se transporta tudo o que nos faz sonhar, como o som, o cheiro ou a luz.
Há sempre mais no que não se vê. Nó de cabeça inclinada a olhar a matéria escura. O breu da muralha onde um dia se penduraram pontos de luz como pequenos tesouros na plenitude teísta. Continuamos a dançar, a embainhar os braços, as mãos e os dedos, uns de acordo com os outros, todos de encontro aos outros, sós, em nós, a agitar o que sempre lá esteve e que de nós não precisa, nem nunca precisou, e não precisa de ter noção e não precisa de consciência. Não precisa de saber. Basta estar e fazer-se agitar, e agitar tudo o que nos envolve para nos dar a ver que tipo de dança nos programaram amanhã, quando a beleza não for questionável e o tempo deixar de ser um mistério irresolúvel. Taciturno para uns, madrugador para os outros.
O vento revelar-se-á pelo vento, a luz pela luz, o deserto pela origem e o mar pela sensualidade dos sonhos.
Depois de juntar todas as partículas, apareceste tu e conversámos sobre a forma das mãos, marcámos um novo encontro e despedimo-nos com reencontro marcado para quando formos apenas um doce bálsamo. E não haverá ninguém a quem culpar ou julgar…

sábado, janeiro 06, 2007

Quero começar o ano aqui no blog com uns versos. Desta vez não sei mesmo em que direcção… Não consta que tenhamos de saber não é? Feliz ano novo a todos, aos presos e aos fugitivos.

Amanhã é intento primaveril
Urge a fresta por onde se sopra o nome
Reencaminha-se o soma ao encontro
Outrora outro,
Ruminava de cor
A cor de uma sala qualquer

Argiloso
Nepótico
Outro num país todo

Não finda
Orgulha-se um contraponto comum
Virá um anjo saber
Orquestrar no porto de um sonho só